Quotidiano (quatro): O primeiro Adeus

Hoje tomo o último 'lanche das seis': o crepe de chocolate e meia de leite gentilmente adivinhados pela funcionária do pacto mas encantado café da esquina. Vou começar a tomar o 'chá das cinco' talvez. Hoje é um dia de despedidas. Despedir-me da delicadeza e sabedoria de alguns; despedir-me da simpatia e confiança de poucos. Despedir-me dos sorrisos proporcionados, das frustrações engolidas, partilhadas e consoladas, dos divertidos e (quase) inofensivos cortes-e-costura...! Despedir-me da senhora que media a tensão todas as semanas e que desde o início me acolheu com o seu sorriso. Despedir-me da excêntrica brasileira, no seu estilo caricato, de dedos apetrechdos de anéis de tal modo que era tarefa dificil conseguir os microlitros de sangue necessários para a medição da glicémia, duas vezes por dia pois nao se conseguia picar. Despedir-me da senhora professora, figura deliciosa do meu dia-a-dia, altivamente reformada, com a autoridade do seu frágil pulso que assentava na perfeição no perfil mais perfeito que a nossa mente pode imaginar de tal figura da sociedade do Portugal passado. Despedir-me, até, da monstruosa figura mais mal cheirosa do distrito que quinzenalmente, para infelicidade das minhas narinas, nos visitava em busca de algo que nunca percebiamos muito bem o quê. Uma despedida breve. Mas o suficiente para dar valor ao que realmente importa. Aos simples gestos que tantas vezes consolam-nos sem nos próprios darmos conta enquanto estamos cegos pela rotineira frieza. Uma simples despedida, uma sentida despedida quando a voz não é suficiente. Fica aqui o seu simbolismo, fica aqui o calor dos olhares e a doçura dos sorrisos. O primeiro adeus.

Quotidiano (três): O Sentido

O que é que realmente faz sentido? A escuridão do frio em redor cega os húmidos olhos cansados. As exigências superam as expectativas, o dia do "tudo faz sentido" taarda e não vem. O que é que realmente faz sentido? Que sentido têm as coisas? O que são as coisas? É mesmo preciso saber?! Que sentido? Qual o caminho do sentido das coisas que não fazem sentido nenhum pois ainda não cheguei sequer ao caminnho para saber o seu sentido?! O sentido? Qual sentido? O sentido sentimento de coordenação perdida nas coordenadas da sociedade do sem sentido mundo. Perder-me; abrir os olhos e por muito que olhe em redor nada vejo. Nada vejo com sentido. Mas o que é que realmente faz sentido? Fecho os olhos, volto a abrir; olho, observo e nada sinto, nada vejo, nada faz sentido. Mas como podem fazer sentido se não sei que sentido as coisas devem ter pois não sei qual é o sentido?! O que é que realmente faz sentido?